segunda-feira, julho 13, 2009

o Mecanismo

felizmente para o funcionamento da sociedade, e para a ausência de motins e suicídios em massa, existem mecanismos que regulam a pressão..... o pré aviso das inspecções e auditorias de qualidade é um e o outro permite a renovação semanal da esperança de fuga à realidade.... o euromilhões

terça-feira, julho 07, 2009

o Mercado

Um dia, quem sabe no tempo dos meus netos, talvez se venha a conhecer entre nós uma Economia aberta e, na qual, o mercado poderá, finalmente, funcionar.

Para já, as expectativas são poucas ou nenhumas de que tal venha a ser verdade. Mas, se formos optimistas, podemos sempre acreditar em fadas dos dentes. Esta curiosa, e imemorial, aliança entre plutocracia e oligarquia parece ser o beco em que as democracias desembocaram e todos parecem satisfeitos. Tanto melhor.

O recente episódio da Media Capital é apenas borbulhagem e espuma de Verão. De facto. Se alguém estivesse efectivamente interessado num mercado livre e aberto já se teria manifestado contra as acções douradas que há por aí. E, elas existem em papel ou em espírito. Mais, nunca se observou alguém, no "arco da governação", ser frontal e abertamente contra essas ‘golden shares'. Ou de outras cores, que não há míngua de ‘shares' laranjas ou rosadas. Com ou sem verdade e políticas de verdade. Ninguém vai dizer nos olhos dos portugueses que vai acabar com essas manobras. Porque só se acabam com transparência. Mas até Setembro aposto dobrado contra singelo que ninguém em boa verdade virá aí dizer que acaba com a coisa. E promove a ética. Temos portanto reunidas as condições para que tudo continue igual. E, de cada vez que cair na rua um episódio, muita gente fingirá surpresa espanto e escândalo. E virá bater no peito. Mas o mercado livre e aberto e respirável não virá. Pântano?

Entre nós as boas ideias nunca são filhas de pai incógnito. Nem de mãe. Mas quando dão raia são inevitabilidades da herança. Como argumento é monótono e aliena eleitores. Depois aborrecem-se com os abstencionistas.

Da mesma sorte de assuntos, constitui a preocupação com o endividamento. Todos os governos utilizaram profusamente a técnica de desorçamentação, e, todos têm mandado (com ou sem dourados retóricos) as empresas alegadamente "privadas" e cotadas em Nova Iorque, endividarem-se e produzirem dívida garantida pelo Estado mas que, convenientemente, não está presente nas operações de cosmética estatística e contabilística com que nos atiram rácios de qualquer coisa sobre o PIB. Nesta área da mascarada temos já doutorados e pós doutorados em fila de espera. É uma vocação magnífica que temos tido desde há muito. A construção de fachadas e a mentira. Agora parece que há outra. Mais uma menos uma. Já se perdeu a aritmética da coisa. Aliás a mentira já nem é novidade que escandalize. É apenas uma constante da equação. Se calhar os exames de matemática ficam fáceis por causa disso mesmo. Existem já tantas constantes que já nem se vislumbram as variáveis.

E, fica sempre bem apresentar um ar de sentido de Estado e falar do futuro dos "nossos" filhos. Que, coitados, vão arcar com a dívida e com os "benefícios". Com a dívida seguramente que os benditos benefícios de estádios do Euro, dos submarinos, da décima quinta travessia Lisboa - Porto em auto-estrada, do TGV entre Faro e Huelva (lembram-se?), dos F16 encaixotados (ou já saíram dos caixotes?), são difíceis de lucubrar.

Ouvi dizer que querem libertar a sociedade do Estado. Cuidado, não vá a "sociedade" não querer a liberdade. Se quisesse já se teria manifestado. Talvez não com a veemência das ruas de Teerão onde há de facto gente que quer ser livre. Mas com um assomo de dignidade. Já se teria dado a exprimir. Contra as ‘golden shares'. Por exemplo. De há muito que a "sociedade" se acostumou a este estado de coisas.

Aceitamos já tudo. Segundo alguns chegámos já ao fundo. Gestos no parlamento. Elegância sublime do presidente da assembleia geral do meu clube, partilhando connosco o estado dos intestinos dele. Enfim. Mas não chegámos ao fundo. Há sempre a possibilidade de descer uma restroescavadora e continuar a aprofundar o buraco. Quiçá um dia atingimos petróleo. Mas não há crise. Em Setembro poderemos mudar. Pelo menos de mentirosos.

publicado no Diário Económico

sábado, maio 09, 2009

teleologia

Uma das coisas mais recorrentes nas minhas aulas, mormente por parte de alunos mais velhos e mais “batidos”, é a irrupção de comentários sobre a distância, quando não mesmo a oposição, entre os “modelos” académicos e a “prática” nas empresas.

Esta "esquizofrenia" é tanto maior quanto mais nos aproximemos de posições mais pós-modernas que salientem o "valor do capital humano", ou da "gestão dos activos imateriais como a lealdade dos clientes", ou dos "novos modelos de lideranças transformacionais". Às vezes a coisa começa se por acaso se fala do ‘paper' do Coase sobre porque é que há empresas e não só mercados, que lhe deu o prémio Nobel. Daí à pergunta para que é que queremos, hoje, empresas pode ser um ápice. Em princípio, as empresas são a mais eficiente maneira de produzirmos produtos escrutinados no mercado, e cujo "comportamento" agregado gera riqueza para todos.

Não obstante esta conhecida litania, os meus alunos salientam crescentemente a distância que vai dos sucessos estrondosos que são enunciados e anunciados em todas as operações de fusões e aquisições, pelo menos a ter em conta o que consta, habitualmente, dos comunicados para as "cêémevêémes" e para a imprensa especializada, e as vivências dos que ficam na "nova empresa" após o emagrecimento das estruturas e obtenção de sinergias. E, que por vezes se traduzem em bizarrias de termos directores de primeira linha que ganham menos que os seus subordinados que tinham na empresa anterior um regime mais vantajoso do ponto de vista da política de remunerações, passando toda a gente a fingir que isso realmente não é importante na vontade indómita de todos em fazer da fusão uma equação em que 1+1 é superior a dois, não fora aquele maçador ‘complot' de condições subjectivas e imprevisíveis que veio a produzir o 1,87 final...

E que dizer do contraste entre a extraordinária bondade da transformação de custos fixos em custos variáveis, que nos motiva a enviar para ‘outsourcing' tudo o que não faz parte do ‘core business', sendo que a dada altura já ninguém sabe muito bem qual era o ‘core' e já se confunde o ‘business'. Por exemplo, a assistência ao cliente que é subcontratada em verdadeiras cascatas até ser finalmente executada pelo Joaquim Epaminondas Desenrrascanços ao Domícilio Unipessoal Ld.ª, pese embora a declaração na missão que nos aponta como valor essencial da empresa o tratamento do cliente enquanto nosso maior activo... Estes processos geradores de esplêndidas cadeias de descontentamento com o "serviço", serão posteriormente, apaziguadas em frustrantes chamadas para ‘call centers' em que estudantes contratados a pataco nos pedem para fazermos o obséquio de aguardarmos, agradecendo de seguida os minutos de espera, oferecendo uma solução que envolve a espera de mais qualquer incerta diligência que acaba por se diluir no quotidiano.

Aparentemente ficamos sempre distantes dos "ideais" que vêm nos manuais ou que os professores transmitem. E pouco importa a disciplina de que falemos. Gestão de recursos humanos, estratégia ou marketing, os sublinhados são, em geral, os mesmos. Existe um mundo idealizado e "bondoso" nos livros, em que as pessoas são tratadas como indivíduos apreciados, valiosos e participativos, retribuindo com criatividade, empenho e diligência, o que contrastaria com a ‘rat race' que ocorre na realidade e que se traduz em aumentos de consumos de ansiolíticos e em sofrimento desnecessário que leva a que a saúde mental se torne uma fonte de preocupação entre a população activa e uma bela linha de investigação daquelas que garantem financiamentos para a investigação. Parece mesmo que um hospital privado duplicou nos últimos meses o número de psiquiatras tal a dimensão da procura dos serviços de gente empregada, desempregada, em vias de se reempregar ou de ficar sem emprego, num fenómeno verdadeiramente interclassista, com subordinados, gestores, directores e administradores a queixarem-se do mesmo. De facto, para que é que queremos empresas?

segunda-feira, abril 13, 2009

Fusões e Aquisições

Em épocas de crise, uma das estratégias mais populares, e oportunas, consiste no aproveitar dos saldos. Empresas em dificuldades, à beira da extinção, são adquiridas por outras cujo desafogo financeiro lhes permite equacionar várias alternativas estratégicas. Ora em contextos de crise, frequentemente encontram-se negócios que são pechinchas...

Uma delas consiste em adquirir concorrentes numa lógica de aumento de quota de mercado. Este é, claramente, o caminho que serve de tema ao capítulo em epígrafe que existe em todos os manuais de estratégia. Podendo aproveitar para adquirir um concorrente e encaixar a sua base de clientes, e ainda as marcas que o concorrente possua, esta é claramente uma boa movimentação estratégica se o negócio for financeiramente vantajoso. Por outro lado, podem adquirir-se empresas cujo negócio não é meramente aditivo sobre o mercado, mas apresenta alguma espécie de sinergia comercial, alargando gamas de produtos oferecidas à nossa base de clientes, permitindo alcançar novos segmentos de mercado em sentido social ou geográfico, permitindo a presença em novas formas de canais de distribuição ou melhorando a eficiência geral da cadeia de distribuição, ou ainda, no sentido tecnológico, possibilitando a melhoria de algum aspecto da cadeia de valor e de conhecimento do negócio original, alargando a possibilidade de lançamento de novos produtos, ou a adopção e assimilação de tecnologias mais promissoras. Podem, ainda, adquirir-se empresas que não apresentando qualquer espécie de relação sinergética com o nosso ‘core business' se situam em sectores de actividade cujas taxas de crescimento a prazo, ou cujas margens de rendibilidade, sejam excepcionalmente atractivas e nesse caso encentamos uma clara diversificação, perseguindo uma visão de portfolio de negócios e de dispersão de riscos. Podem, naturalmente adquirir-se empresas cujos balanços contêm reservas ocultas de valor, sob a forma de imobilizados ainda em condições de serem liquidados com mais valias interessantes, ou que podem ser deslocalizados sem grande alarido, ou sob a forma de patrimónios imobiliários registados por valores do século dezoito, ou de valores mobiliários pouco expostos a riscos excessivos, e cuja liquidação permita encaixar verbas consideráveis, sem que a consequente resolução dos passivos seja demasiado penalizadora. Isto é, os credores possam ser persuadidos que receberem uma fracção dos seus créditos é uma bênção do céu.

Mais modernamente, podemos, ainda, adquirir empresas em dificuldades e cujos problemas adquirem tal grau de exposição mediática, embaraçando tanta gente, que a sua aquisição, embora, sem seguir nenhuma lógica empresarial anteriormente mencionada, e mesmo desafiando alguns aspectos fundamentais da gestão financeira, como o princípio de que as operações devem ser racionais, apresentem, ainda assim algum aspecto interessante. Podemos, então falar de uma feliz associação entre a esfera dos negócios e outras esferas, e as aquisições de empresas, aparentemente sem mercado ou sem produto ou sem ambos, conduzem à constituição e acumulação de "direitos especiais de saque" que podem ser posteriormente convertidos. Talvez não nalguma bolsa de valores mobiliários, nem sequer sob a forma de produtos tóxicos, tão populares ultimamente, mas sob a forma de "ponderações de ordem subjectiva em futuras apreciações de propostas para concursos" que permitam vislumbrar a possibilidade de elevadas probabilidades de vencer esses concursos ou ocasionem a abertura de "avenidas mais promissoras nomeadamente sob a forma de negócios, que corram em contextos, em que se possa evitar uma excessiva exposição aos factores de concorrência em mercado aberto". Há várias vantagens nestas parcerias público privado. Nomeadamente evitar formas aborrecidas de ‘dumping', bem como ser nomeado como um adepto do proteccionismo, que resulta sempre num considerável e evitável enxovalho, como resultou óbvio da recente cimeira do G20.

Esta notável, e feliz, evolução no campo das fusões e aquisições, reforça uma outra apreciável tendência que sedimenta a nossa confiança no futuro prenhe de alianças estratégicas entre plutocratas e oligarcas que nos poupa à maçada de ter de produzir escolhas complexas e nos proporciona melhores níveis de estabilidade e de conforto.

terça-feira, março 17, 2009

ruidos

Finalmente temos uma palavra. Grande depressão. Até os bens de Giffen ou de luxo caem nos índices de consumo, contrariando a teoria económica que se ensina logo na terceira semana de micro economia. O Financial Times fez um ‘endorsement' de um livro que, entre muitos outros, arrasa com a hipótese do mercado eficiente. O doutor Trichet, contudo, parece dizer que a crise acaba já numa destas quintas-feiras e quiçá nem se dá por ela. Os juros caem a pique no BCE e os juros nem tugem nem mugem nos empréstimos, porque os ‘spreads' parecem de ajustamento automático. Um banco falido e nacionalizado lá fora continua a oferecer crédito a torto e a direito em centros comerciais ao pé de si, apenas por 30% de juros ao ano, e, naturalmente, a pessoas financeiramente iletradas, que parecem não ter condições de reembolsar nem uma parte do capital. Já se suspeita que o presidente Obama não caminhará sobre as águas.

Na vertente da gestão psicológica da crise, portanto com impacto nas expectativas que se desenvolvem e nos incentivos que se percebem, o que segundo os economistas acidentais ou economistas e psicólogos da ‘freakanomics', constitui a pedra filosofal da coisa, assistimos, finalmente, a algum ressarcimento. Ou seja, o autor do esquema de Ponzi foi dentro. O do esquema americano naturalmente. Pelo menos teremos um bode expiatório razoável. Estimulando a ideia de que afinal é capaz de não compensar ser um escroque mesmo que com a atenuante de padecer de megalomania, delírios de grandeza e paranóias conexas. Por cá, assistimos dia sim dia não a uma procissão de vítimas indefesas de um malévolo Mefistófeles que está detido. Só o dito filho de Satã é que fazia e desfazia. Todos os outros seres de vez em quando arriscavam uma pergunta que, segundo os próprios, ficava sem resposta e, naturalmente, já nem arriscavam uma segunda via, não fosse parecer indelicadeza. Incapazes de realizarem alguma acção mais arrojada parece que o dito Belzebu, inclusive, os impedia de saírem do banco e procurarem outro emprego. Eu confesso que tenho ficado extremamente compungido com o horrível e silencioso sofrimento que tantos e tantos administradores e quadros tiveram de suportar e do qual nem agora conseguem fazer uma catarse redentora.

Noutra novela mexicana bancária que parece também termos o dever (quiçá, obrigação patriótica?!) de defender, parece que se passaram coisas estranhas, opacas e também aí o mercado teve de ser refreado e a mão invisível teve de ser enclausurada. Entrementes, assistimos a procissões de associações de interesses a pedir ajuda do pai protector e omnipresente. O doutor Medina Carreira reafirma o que já vem dizendo há umas décadas, pelo menos desde que eu me recorde de pensar em recursos escassos e coisas afins. Decorrerão outras tantas décadas e saberemos qualquer coisa vinda de operação tornado. Fomos visitados por eminentes e importantes dignitários da metrópole. Descobriu-se que a língua de Camões é uma prova hercúlea para o "legislador" e para o "tradutor". Sabe-se que a despesa pública pode ter efeitos imediatos e mediatos. A bondade da dita despesa é de geometria variável consoante parâmetros complexos e indecifráveis para os leigos que vão ter de produzir escolhas a breve trecho sobre o nosso futuro colectivo no meio desta incerteza e confusão. A opção pela hipótese imediata, pôr gente a fazer "piquenas" reparações em todos os concelhos do país pode gerar mais emprego que, não obstante, será pouco reprodutor a prazo, mas rende mais votos já. A opção pelas grandes obras poderá ter efeitos multiplicadores a prazo a não ser que nos tenham mentido e todas as anteriores grandes obras afinal não tiveram efeitos. Coisa certinha com os estádios de bola feitos para o Euro que, ainda por cima, não estão preparados para uma final ou abertura do Mundial de 3298...

Estes folhetins naturalmente fortalecem a confiança nas instituições democráticas e nas instituições em geral, reforçam a percepção de justiça e de expectativa no futuro e fornecem bastos incentivos a que o Bordalo Pinheiro seja recordado, mesmo que a fábrica propriamente dita mande mais gente para a fila dos desempregados que aguardam o desenrolar dos próximos capítulos.

publicado hoje no diário económico