A concretização do negócio da compra da Chrysler pela Cerberus parece simbolizar o triunfo da visão “hard line” em Gestão. Isto é, o abandono do pós modernismo que atribuía misteriosos good will a empresas cujos activos cresciam, as despesas explodiam e as vendas eram pouco mais que anedóticas, mas as acções subiam de modo consistente e incompreensível para aqueles que foram formados na escola da análise fundamental e que nunca tinham sido seduzidos pelos head and shoulders dos programas tipo MetaStock. O crash da “economia da bolha” terminou com esses delírios. De volta ao mundo real, a aterragem da Banca, entre outros, foi dolorosa. Hoje, a exigência de resultados palpáveis, i.e. mensuráveis em dinheiro é um must. Voltámos mesmo à sabedoria mais “ancestral” de um marketing em que dos quatro pês, só o pê do preço é que é mágico porque gera cash inflow. Todos os outros representam dinheiro a sair...
A Cerberus é uma private equity com uma, aparente, estratégia de portfolio de base financeira pura e dura. Embora se consultarmos o seu website sejamos presenteados com uma linguagem mais tranquilizadora e com uma aparente vocação industrial, o carácter do negócio parece ser bem mais simples. Comprar empresas falidas e produzir um turnaround rápido e eventualmente doloroso mas eficaz. Depois a empresa pode ser recolocada no mercado para venda. A Cerberus mereceu alguma atenção, recentemente, porque segundo a Business Week comprou nos últimos tempos empresas em valor superior a dez biliões de dólares.
Em boa verdade o fenómeno não é novo. A Omnicom , a Cendant , a LVHM, são apenas alguns exemplos de empresas cuja vocação financeira aparece aliada à vocação de gestão de marcas para segmentos ou actividades específicas. Mas a base financeira é inequívoca. A exigência de rendibilidade mínima de x% por ano é imperativa. Estas empresas, algumas cotadas na bolsa outras completamente privadas, utilizam métodos de portfolio para avaliar o sucesso dos posicionamentos das empresas que titulam e, em geral, são constituídas por meia dúzia de especialistas com formação em finanças. Uma das coisas curiosas sobre estas empresas é que toda a gente é vice presidente, mas basicamente vice presidente de si próprio...
Quem sabe, este será o modelo de gestão de futuro reservado ao ocidente. Massas monetárias geridas por magos financeiros sem espírito empreendedor nem interesse pela inovação, muito menos pelos produtos e serviços, nem pelos clientes ou colaboradores, mas que garantem rendibilidades interessantes aos participantes privados/accionistas/obrigacionistas. Sob o guarda-chuva protector de marcas telúricas, criadas para que os consumidores estabeleçam relações de lealdade para além da materialidade dos produtos, numa verdadeira dimensão e domínio de transcendência, (com as quais a própria Igreja aprenderá), com produções totalmente deslocalizadas, com I&D deslocalizadas, com serviços administrativos deslocalizados, com assistência técnica e call-centers deslocalizados. Tudo a caminho das actuais periferias, permanecendo nos centros, eventualmente, apenas as private equities que gerem estas verdadeiras networks de actividades e processos como puzzles organizacionais descartáveis e efémeros e que em gestão de modo entusiasmado se tipificam como loose couplings.
Entre nós, esta visão pura e dura, assente na separação clara entre propriedade e gestão, com a gestão contratada sem eufemismos para gerar efectivo e inequívoco valor para o detentor do capital não colhe muitos adeptos. Entre nós, além dos colaboradores e dos clientes são ainda claramente preteridos os accionistas em favor dos gestores de circunstância.
Possivelmente esta visão é um bocado “dantesca” e manifestamente exagerada. Não obstante tem algumas “virtualidades” como costumam dizer algumas pessoas em politiquês. Nomeadamente, e, como membros da private equity deste país, a de permitir perguntar se existirá algum inconveniente em proceder ao outsourcing de governação desde Bangalore...
©José Manuel Fonseca
terça-feira, julho 17, 2007
terça-feira, julho 10, 2007
A retórica
Hoje em dia, somos bafejados pela afortunada aparição de produtos que nos oferecem quase tudo o que um cidadão da pós modernidade necessita para ser completamente feliz e integrado na sociedade e nos seus grupos. Objectos híbridos e minúsculos que nos permitem telefonar, ver filmes, assistir em directo à novela das sete, das nove, das dez e, quem sabe, mesmo e inclusive, a das onze, para além, de armazenarem as fotos dos casamentos, baptizados, festas realizadas em todo o hemisfério norte, mais os vídeos do National Geographic ou de todas as séries de conselhos práticos do it yourself do Turquemenistão, mais a nossa agenda com dezoito níveis de alarmes, para nunca esquecermos o dia em que se comemora o aniversário da primeira vez que comprámos uma garrafa de azeite no supermercado com aquela que viria a ser a nossa mulher (uma coisa que os homens tem particular tendência a não recordarem e que está na origem dos divórcios), armazenar os álbuns de músicas da nossa juventude, ter online os conselhos úteis para nos relembrarmos do que se espera de nós numa entrevista de emprego mesmo com tutorial de ensaio final, ligação automática de hora a hora ao centro de domótica lá de casa para sabermos da evolução do stock de alho francês na prateleira da esquerda do frigorífico, ligação contínua ao GPS localizado no telemóvel dos nossos filhos e com os mapas de Azeitão e Ullapool, marcação automática de consultas de reiki, monitor cardíaco, consulta de saldos do cartão de débito, planeamento fiscal...
No marketing, há muito que se fala de uma dimensão mental dos produtos. Para alem do produto em si mesmo (as suas características físicas, a electrónica ou a química da coisa, as dimensões, resistências, energias), e do produto “estendido”, com as suas assistências pós venda, garantias, peças de substituição e acessórios, há aquilo que cada um “vê” no produto. E, com correcta identificação dos segmentos de mercado e das idiossincrasias de cada um, pode-se “desenhar” a politica de comunicação adequada à motivação da acção de compra por parte de pessoas convencidas ou persuadidas que irão adquirir, por exemplo, através de um mero leitor de mp3, a entrada para a galeria dos famosos, senão do país, pelo menos do salão de cabeleireiro da paróquia. A posse dos produtos, já nem sequer estamos a falar de utilização, porque a utilização é por vezes bastante complexa e incerta, está associada, a significados que transcendem as suas características funcionais e reais. Neste sentido, assistimos à explosão da dimensão “retórica” dos produtos. À construção de mensagens que nos transportam para universos paralelos e fabulosos de fantasias mais ou menos benignas, se, nos deslocarmos a um qualquer estabelecimento e adquirirmos um magnifico e extraordinariamente exotérico seguro de acidentes pessoais ou automóvel...
No meio deste mundo admiravelmente novo emergem palavras que comportam ressonâncias arcanas e mágicas como Customer Satisfaction! Em qualquer universidade que se preze, mormente já em Bolonha, a litania da satisfação do cliente deve ser administrada como um mantra. Embora na próxima revisão da coisa se deva, quem sabe, ensinar aos alunos os simples sistemas de equações de trinta e quatro variáveis necessários para descodificar os planos de tarifários das operadoras de telecomunicações...
E, é difícil não sermos contagiados por este verdadeiro vírus da felicidade, quando passados os dois anos de garantia do produto, é mais barato comprar um produto novo que mandar reparar o antigo, sendo que o novo produto já tem mais cem milhões de pixels que o antigo, ou as rpm mais que triplicaram entretanto, ou quando, ainda dentro da garantia, apenas passados dois ou três meses de espera nos devolvem o produto completamente novo e com um chip de cem “menréis” devidamente reparado na Lapónia Oriental...
Eu confesso que, enquanto aguardo a realização do sonho de um vida inteira, de ter um telemóvel que me permita ver em cinemascope o último episódio da novela das seis, não me importava de possuir produtos que simplesmente funcionassem...
©José Manuel Fonseca
No marketing, há muito que se fala de uma dimensão mental dos produtos. Para alem do produto em si mesmo (as suas características físicas, a electrónica ou a química da coisa, as dimensões, resistências, energias), e do produto “estendido”, com as suas assistências pós venda, garantias, peças de substituição e acessórios, há aquilo que cada um “vê” no produto. E, com correcta identificação dos segmentos de mercado e das idiossincrasias de cada um, pode-se “desenhar” a politica de comunicação adequada à motivação da acção de compra por parte de pessoas convencidas ou persuadidas que irão adquirir, por exemplo, através de um mero leitor de mp3, a entrada para a galeria dos famosos, senão do país, pelo menos do salão de cabeleireiro da paróquia. A posse dos produtos, já nem sequer estamos a falar de utilização, porque a utilização é por vezes bastante complexa e incerta, está associada, a significados que transcendem as suas características funcionais e reais. Neste sentido, assistimos à explosão da dimensão “retórica” dos produtos. À construção de mensagens que nos transportam para universos paralelos e fabulosos de fantasias mais ou menos benignas, se, nos deslocarmos a um qualquer estabelecimento e adquirirmos um magnifico e extraordinariamente exotérico seguro de acidentes pessoais ou automóvel...
No meio deste mundo admiravelmente novo emergem palavras que comportam ressonâncias arcanas e mágicas como Customer Satisfaction! Em qualquer universidade que se preze, mormente já em Bolonha, a litania da satisfação do cliente deve ser administrada como um mantra. Embora na próxima revisão da coisa se deva, quem sabe, ensinar aos alunos os simples sistemas de equações de trinta e quatro variáveis necessários para descodificar os planos de tarifários das operadoras de telecomunicações...
E, é difícil não sermos contagiados por este verdadeiro vírus da felicidade, quando passados os dois anos de garantia do produto, é mais barato comprar um produto novo que mandar reparar o antigo, sendo que o novo produto já tem mais cem milhões de pixels que o antigo, ou as rpm mais que triplicaram entretanto, ou quando, ainda dentro da garantia, apenas passados dois ou três meses de espera nos devolvem o produto completamente novo e com um chip de cem “menréis” devidamente reparado na Lapónia Oriental...
Eu confesso que, enquanto aguardo a realização do sonho de um vida inteira, de ter um telemóvel que me permita ver em cinemascope o último episódio da novela das seis, não me importava de possuir produtos que simplesmente funcionassem...
©José Manuel Fonseca
segunda-feira, julho 02, 2007
A Não Comunicação
Todos os dias inventamos coisas novas e sofisticadas para evitar falarmos uns com os outros olhando-nos de frente. Parece um paradoxo na era dos telemóveis cada vez mais sofisticados e dos milhões de esseêmeesses que se trocam, dos emails, da internet 2.0 com comentários online e fóruns para tudo e para nada....
Pois é. Mas, não obstante tanta fartura e variedade, fazemos cada vez mais esforço para nos evitarmos. Claro que é impossível não comunicar como sustentou o Paul Watzlawick em divertidos, e por vezes inquietantes livros, mas nós persistimos em inventar formas de não comunicar. Sobretudo de não conversar. Simplesmente conversar sobre as coisas e sobre os problemas. Não senhora. Fazemos logo uma reunião, ou várias, com actas. E anexos. Tudo o que evite ter de enfrentar o problema e o possa reduzir a coisas que se possam arrumar em procedimentos. Idealmente desenhamos mais um belíssimo sistema de gestão documental.
E regulamentos. Regras, normas. Abstractas, impessoais. Protectoras. Aqui há uns anos, entrei numa sala de aula que tinha um aviso seco, frio e formal. “É proibido utilizar telemóveis durante os exames”. Pensei imediatamente que os alunos tinham dado algum passo em frente nas técnicas de copianço. Que algures no bar da faculdade uns comparsas de livros abertos estavam a enviar por sms as respostas ao exame. Ou que por auriculares minúsculos e disfarçados pelos cabelos e perucas recebiam as respostas vírgula a vírgula. Mas não. Não era por causa desses manhosos. Tinha acontecido que um assistente de direito, durante uma prova, se entretivera a ditar umas minutas de cartas e outras importantes deliberações, à secretaria. Que no escritório tomava notas, de forma, quiçá, pouco diligente, porque o assistente berrava desalmado e insultava a dita secretaria que possuiria apenas uma escassa percentagem do cérebro, para além de moral sexual duvidosa...
Claro que até à sexagésima fila da sala de exame (que possuía apenas dez filas...) a rapaziada teve dificuldade em se concentrar, não conseguiu responder às perguntas, agitou-se, mas evitou chamar a atenção do assistente que, já se sabe, tem a faca e o queijo senão na mão pelo menos à mão de semear. E, depois, claro está, pela calada fez queixinhas ao director da faculdade. O assunto mereceu superior consideração e, em lugar de se chamar o assistente e de lhe pedir encarecidamente que não repetisse a façanha, ou, quem sabe, perguntar-lhe se era assim um imbecil de modo consistente ou tinha sido meramente episódico o fenómeno. Não senhora. Fez-se uma regra abstracta, pública, dirigida a todos, mesmo os noventa e nove por cento dos que nunca lhes tinha passado pela cabeça serem tão idiotas. Com essa regra, insultou-se a inteligência de muitos mas, poupou-se a alguém um confronto que eventualmente poderia ser penoso e comportar angústias ou mesmo medos.
Na área da gestão de carreiras, de atribuição de recompensas, de promoções, de avaliação de desempenho também se observa este esforço insano para evitar a comunicação face a face. Evitar confrontarmo-nos com o “outro”. Temos arranjado múltiplos sistemas de pontos e critérios e ponderadores para reafirmar e sublinhar o que toda a gente sabe à partida. Mas que aparece disfarçado em fórmulas, para que não sejamos forçados a explicar as escolhas, que toda a gente sabe que já estavam feitas mas que deste modo realmente “científico” ninguém tem de argumentar.
Um dos sintomas de esquizofrenia organizacional consiste no avolumar destes procedimentos que nos protegem das ansiedades da vulgar conversa e da descoberta que o outro é um ser muito razoável e até simpático...
© José Manuel Fonseca
Pois é. Mas, não obstante tanta fartura e variedade, fazemos cada vez mais esforço para nos evitarmos. Claro que é impossível não comunicar como sustentou o Paul Watzlawick em divertidos, e por vezes inquietantes livros, mas nós persistimos em inventar formas de não comunicar. Sobretudo de não conversar. Simplesmente conversar sobre as coisas e sobre os problemas. Não senhora. Fazemos logo uma reunião, ou várias, com actas. E anexos. Tudo o que evite ter de enfrentar o problema e o possa reduzir a coisas que se possam arrumar em procedimentos. Idealmente desenhamos mais um belíssimo sistema de gestão documental.
E regulamentos. Regras, normas. Abstractas, impessoais. Protectoras. Aqui há uns anos, entrei numa sala de aula que tinha um aviso seco, frio e formal. “É proibido utilizar telemóveis durante os exames”. Pensei imediatamente que os alunos tinham dado algum passo em frente nas técnicas de copianço. Que algures no bar da faculdade uns comparsas de livros abertos estavam a enviar por sms as respostas ao exame. Ou que por auriculares minúsculos e disfarçados pelos cabelos e perucas recebiam as respostas vírgula a vírgula. Mas não. Não era por causa desses manhosos. Tinha acontecido que um assistente de direito, durante uma prova, se entretivera a ditar umas minutas de cartas e outras importantes deliberações, à secretaria. Que no escritório tomava notas, de forma, quiçá, pouco diligente, porque o assistente berrava desalmado e insultava a dita secretaria que possuiria apenas uma escassa percentagem do cérebro, para além de moral sexual duvidosa...
Claro que até à sexagésima fila da sala de exame (que possuía apenas dez filas...) a rapaziada teve dificuldade em se concentrar, não conseguiu responder às perguntas, agitou-se, mas evitou chamar a atenção do assistente que, já se sabe, tem a faca e o queijo senão na mão pelo menos à mão de semear. E, depois, claro está, pela calada fez queixinhas ao director da faculdade. O assunto mereceu superior consideração e, em lugar de se chamar o assistente e de lhe pedir encarecidamente que não repetisse a façanha, ou, quem sabe, perguntar-lhe se era assim um imbecil de modo consistente ou tinha sido meramente episódico o fenómeno. Não senhora. Fez-se uma regra abstracta, pública, dirigida a todos, mesmo os noventa e nove por cento dos que nunca lhes tinha passado pela cabeça serem tão idiotas. Com essa regra, insultou-se a inteligência de muitos mas, poupou-se a alguém um confronto que eventualmente poderia ser penoso e comportar angústias ou mesmo medos.
Na área da gestão de carreiras, de atribuição de recompensas, de promoções, de avaliação de desempenho também se observa este esforço insano para evitar a comunicação face a face. Evitar confrontarmo-nos com o “outro”. Temos arranjado múltiplos sistemas de pontos e critérios e ponderadores para reafirmar e sublinhar o que toda a gente sabe à partida. Mas que aparece disfarçado em fórmulas, para que não sejamos forçados a explicar as escolhas, que toda a gente sabe que já estavam feitas mas que deste modo realmente “científico” ninguém tem de argumentar.
Um dos sintomas de esquizofrenia organizacional consiste no avolumar destes procedimentos que nos protegem das ansiedades da vulgar conversa e da descoberta que o outro é um ser muito razoável e até simpático...
© José Manuel Fonseca
O Plano de Negócios
Parece que nos encaminhamos para a “empresarialização” das escolas públicas. Aparentemente, as escolas primárias e secundárias terão de encontrar “unidades de negócio” alternativas como forma de financiamento das suas actividades escolares e da renovação das suas instalações e equipamentos. Os professores, para além das aulas propriamente ditas, poderão ter de se preocupar com a “rentabilização” dos espaços e equipamentos. Talvez num futuro não muito distante possam também “rentabilizar” os recursos humanos, quem sabe através de inovadoras actividades de fabrico de croquetes, serviços de catering, de karaoke e de jongleurs...
No fundo nada que não ocorra já em muitos estabelecimentos por esse pais fora. Há, contudo, uma diferença entre poderem recorrer ao aluguer de espaços ao fim de semana, como forma de arredondarem os parcos orçamentos, e a “necessidade”, ou imperativo, de se preocuparem com a “rentabilização” dos recursos tornando-se mais especializados em eventos e tendo deliberadamente de concorrer com empresas vocacionadas para essa actividade. Supõe-se que, apesar desta descoberta sociológica do fascinante mundo empresarial, os professores, quem sabe alguns deles ao menos, continuem a ter como missão ensinar os alunos.
Mas, nesta onda e na trajectória, podemos ir bem mais longe. Rapidamente poderemos assistir a aproximações de marcas e empresas que poderão oferecer patrocínios apelativos. A troco da visibilidade de cartazes no interior, ou para o exterior, das escolas, as instituições poderão ter chamadas de telemóvel mais baratas, vouchers de desconto no Feira Nova, quem sabe poderão receber computadores portáteis, a troco de visionamento de publicidade nas salas de aula, poderão receber material multimédia, a troco de corners temporários poderão receber equipamentos de educação física dignos de ginásios de topo, a troco de stands permanentes e alternativas ao bar e à papelaria, podem-se assinar contratos mais completos de apoio. Daqui a presenças na sala de aula no tempo lectivo é um curto passo. E porque não manuais escolares patrocinados por marcas de chocolates, yogurtes ou de roupa cool?
O projecto educativo do ciclo da água pode ser substituído pelo importante ciclo de fabrico de ténis em qualquer sweat shop na Ásia. A circulação do sangue nos seres humanos pode ser vista em cd rom em casa e na sala de aula pode ser substituída pelo ciclo de fabrico de hambúrgueres de uma qualquer marca de franchise. Os projectos de “investigação” criadores de “competências” poderão ser apenas formas de arranjar ainda mais dinheiro para as escolas. Por exemplo, e sabiamente contornando as leis de trabalho infantil, podem-se instruir os miúdos para recolherem inquéritos de mercado preenchidos pelos alunos e famílias, e por transeuntes nas bombas de gasolina ou nos centros comerciais. Promovendo ainda uma política activa de “estágios” dos alunos no sector da macdonaldização de empregos para adolescentes. Tudo isto resultando em sérios incrementos da capacidade de interacção social dos alunos e de fortíssimo reforço da “empregabilidade” da população escolar.
Tudo isto me parece bastante legítimo e lógico. Pelo menos numa sociedade em que a preparação das crianças para a vida passe a enquadrar a preparação para os actos de consumo. Poderemos finalmente reduzirmo-nos ao momento de consumo. Sem passado e sem futuro.
© José Manuel Fonseca
No fundo nada que não ocorra já em muitos estabelecimentos por esse pais fora. Há, contudo, uma diferença entre poderem recorrer ao aluguer de espaços ao fim de semana, como forma de arredondarem os parcos orçamentos, e a “necessidade”, ou imperativo, de se preocuparem com a “rentabilização” dos recursos tornando-se mais especializados em eventos e tendo deliberadamente de concorrer com empresas vocacionadas para essa actividade. Supõe-se que, apesar desta descoberta sociológica do fascinante mundo empresarial, os professores, quem sabe alguns deles ao menos, continuem a ter como missão ensinar os alunos.
Mas, nesta onda e na trajectória, podemos ir bem mais longe. Rapidamente poderemos assistir a aproximações de marcas e empresas que poderão oferecer patrocínios apelativos. A troco da visibilidade de cartazes no interior, ou para o exterior, das escolas, as instituições poderão ter chamadas de telemóvel mais baratas, vouchers de desconto no Feira Nova, quem sabe poderão receber computadores portáteis, a troco de visionamento de publicidade nas salas de aula, poderão receber material multimédia, a troco de corners temporários poderão receber equipamentos de educação física dignos de ginásios de topo, a troco de stands permanentes e alternativas ao bar e à papelaria, podem-se assinar contratos mais completos de apoio. Daqui a presenças na sala de aula no tempo lectivo é um curto passo. E porque não manuais escolares patrocinados por marcas de chocolates, yogurtes ou de roupa cool?
O projecto educativo do ciclo da água pode ser substituído pelo importante ciclo de fabrico de ténis em qualquer sweat shop na Ásia. A circulação do sangue nos seres humanos pode ser vista em cd rom em casa e na sala de aula pode ser substituída pelo ciclo de fabrico de hambúrgueres de uma qualquer marca de franchise. Os projectos de “investigação” criadores de “competências” poderão ser apenas formas de arranjar ainda mais dinheiro para as escolas. Por exemplo, e sabiamente contornando as leis de trabalho infantil, podem-se instruir os miúdos para recolherem inquéritos de mercado preenchidos pelos alunos e famílias, e por transeuntes nas bombas de gasolina ou nos centros comerciais. Promovendo ainda uma política activa de “estágios” dos alunos no sector da macdonaldização de empregos para adolescentes. Tudo isto resultando em sérios incrementos da capacidade de interacção social dos alunos e de fortíssimo reforço da “empregabilidade” da população escolar.
Tudo isto me parece bastante legítimo e lógico. Pelo menos numa sociedade em que a preparação das crianças para a vida passe a enquadrar a preparação para os actos de consumo. Poderemos finalmente reduzirmo-nos ao momento de consumo. Sem passado e sem futuro.
© José Manuel Fonseca
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