domingo, março 18, 2007

A ascensão do irrelevante fútil

Fascinante o número de objectos que adquirimos e as suas propriedades mágicas. Há tempos tive de trocar a pilha num relógio. Aparentemente o dito tinha de ser enviado para longe por forma a que pessoal especializado procedesse à troca da pilha repondo a "estanquicidade" da caixa, possibilitando de "novo" que o relógio mergulhasse a 200 metros de profundidade. Toda esta operação custava o suficiente para adquirir dois ou três relógios novos e demorava pelo menos umas semanas... Em alternativa gastava uma quantia insignificante e fazia logo ali, no relojoeiro, a troca da pilha e o relógio continuava a dar horas...
Ora como nunca o bendito relógio mergulhara a "200 metros".... a coisa ficou logo ali resolvida....

Depois, olho em redor e tenho forma de arquivar a história de vida da população inteirinha do hemisfério norte. Mais as fotografias das respectivas famílias nos últimos seis séculos e os videos das festas de anos e de Natal. Possuo numa única divisão da casa mais capacidade de armazenamento de informação que o governo norte americano dispôs na década de sessenta no período do psicopata que comandou o FBI...
toda esta capacidade de armazenamento de informação jaz por aqui e por ali...
presumivelmente nunda darei uso (ou bom uso) a tantos teras de capacidade, mas parece haver um conforto em tanta redundância e tanto excesso....

quinta-feira, março 15, 2007

As Classes e a falta de classe

Ainda hoje um amigo meu me chamou a atenção para as classes na nossa sociedade e para a fraca mobilidade social. Existem, para mim, pelo menos duas classes. Uma que parece estar vacinada à partida e por definição. Estas pessoas por natureza e com naturalidade circulam entre ocupações e postos independentemente da sua competência ou vocação. Estas pessoas possuem uma espécie de direito natural a ganhar uma remuneração pela simples razão que existem e ocupam espaço físico e temporal. Reajem muito mal às manifestações de terceiros pela mesma sinecura que parecem possuir sem necessidade de justificação.

Ainda esta semana fui muito desagradavelmente surpreendido por uma destas criaturas. Aparentemente, eu, membro inequívoco da outra classe, a que tem de se penitenciar e pedir desculpa por existir e por usufruir de um income em troco do seu trabalho, portanto uma classe que tem de expiar uma "culpa cristã" sem hipótese de redenção, fui amavelmente aconselhado a sacrificar-me pela "Instituição" em que ocasionalmente a criatura desempenha magnificas funções. Mais, estaria eu em débito irresolúvel e perene por a "Instituição" me ter "aceite de volta" quando há algum tempo eu miseravelmente trai a "confiança" depositada em mim e saí. O facto de por defeito ou por mérito ficar sempre entre os melhores avaliados na bendita "instituição" de ter um passado na dita, parece não contar. O tempo é, assim, sempre o presente e o potencial no futuro. Mas, para a outra classe, a das criaturas, nem sequer existe essa dimensão de tempo. São imortais. São verdadeiros titãs e seres arcanos. Na feira de carcavelos podem-se comprar em bonequinhos. Sem classe nenhuma.

segunda-feira, março 12, 2007

A ilusão

uma das coisas que me interessa, é a criação de realidades imaginária, através das quais as pessoas racionalizam o que lhes acontece no quotidiano, e as ameaças que sentem advir de uma realidade fragmentada, imprevisível e sem vinculação aparente entre as coisas. O post anterior ilustra os rituais de "qualidade" que nos atormentam mas que diligentemente e sem sentido crítico (só às escondidas e com pessoas de confiança ou em voz baixinha...) deixamos correr sem questionar da irracionalidade da liturgia e da litania e, sobretudo sem perguntar onde está a qualidade que era suposto resultar disto tudo. Mas, noutras áreas de sofrimento humano também nos deixamos ir atrás de realidades virtuais. Outra palavra mágica é a "mudança". Porquê? porque sim. Basicamente toda a gente sabe que tem de mudar. Porquê e para quê aparentemente ninguém sabe a não ser que mobilize como justificação outras abstracções. A eficiência. O progresso. A modernidade. A sobrevivência. Como se medem estas coisas? Como se evidenciam? Ninguém parece saber ou concordar....

sexta-feira, março 09, 2007

Psicopatia Geral

De vez em quando meto-me em sarilhos. Quer isto dizer que de vez em quando meto-me no meio de processos e projectos com chancela de qualidade e subsidiados pela União Europeia através de uma qualquer das suas incontáveis directorias e subdirectorias e agências e comissões e grupos e comités ou outra qualquer designação. Nas duas últimas semanas tive de dar uma formação (um dia inteirinho) a dois grupos de seres humanos. Em negociação e aspectos associados com a persuasão e vendas e compras de utensílios domésticos ou maquinaria e alfaias agrícolas.

No início da sessão distribuí um questionário de avaliação de conhecimentos que se repetia no fim da sessão. É, naturalmente, suposto que uma atenta análise comparativa entre os dois questionários assinale, evidencie, demonstre uma evolução durante o dia, mercê da excepcional formação "recebida"... é, portanto, suposto que a formação ilumine as almas e o caminho teleológico daquelas pessoas que sem, aquela formação em concreto, teriam como destino, eventualmente, o negrume do falhanço social económico familiar e pessoal. Através de múltiplas sessões de formação como aquela, e da óbvia evidência da progressão, as pessoas resgatam-se do desespero. Qualificam-se. Elevam-se.

Claro que além deste questionário há ainda mais papelada para preencher. Utilíssima. O formador, será julgado pelos formandos. Pode-se dar o caso do formador não possuir qualidades suficientes para ajudar, no processo de elevação ao nirvana, daquelas pessoas. O formador também deve preencher uma folhinha por cada formando. Pode-se dar o caso do formando não vislumbrar a genialidade do sistema e de não ser merecedor da participação nestes benfazejos cursos e processos. Há ainda as folhas de presenças, as folhas de sumário por sessão, as folhas de objectivos por sessão, o plano da sessão propriamento dito e as folhas de incidentes e anomalias e não conformidades, bem como o relatório final.

Dúvido, claro está, que algum destes inquéritos passados em milhares de formações não demonstre que os formandos melhoraram imenso (num único dia...), que os formadores não sejam todos quase semi deuses, e que os formandos não tenham demonstrado enorme empenho, dedicação, atenção, vontade de aprender e particpação construtiva.

Claro está, uma parte substantiva da sessão de formação é gasta a preencher esta papelada que no final será inspeccionada e terá de bater a bota com a perdigota...