quinta-feira, fevereiro 02, 2012

A assunção da culpa

não há nada mais judaico-cristão que a culpa. Ao fim ao cabo já nascemos com o sinal da culpa primordial. O umbigo. Ao longo da vida carregamos a cruz e com sorte, expiamos os pecados confessando ou obtendo uma bula. Mas a culpa acompanha-nos como uma amiga. Pelo menos a alguns que eu pessoalmente não compartilho esse peso. Outros terei.

Vem isto a propósito do conformismo da malta em relação aos executores da pena. Porque a culpa é omnipresente, e por defeito, não carece de prova. É porque sim. Portanto os troikos apenas nos relembram a sua existência. Parece que todos nos portámos muito mal. E a espada de Demócles pende sobre nós presa por fio mais fino e menos resistente que o da crina do cavalo. Pende sempre desde que nascemos . Junta-se a esta crença da culpa a crença de que somos menores. Mais preguiçosos. Menos espertos. Uns madraços. E que beneficiamos de uma série de benesses que desbaratámos. Todos. Já eramos culpados mas agora carregamos fardo adicional de culpa. E o fardo todos os dias cresce.

De modos que aceitando a condenação e a sua justeza e aceitamos com indiferença. No fundo habituamo-nos a ser culpados. De qualquer coisa. E fugimos. Da multa. Da polícia. Do fisco. De nós. Da dignidade. De ter costas direitas. De exigir uma melhor explicação para esta culpa. De exigir que os culpados sejam castigados . E assim vamos vivendo. Habitualmente. Cheios de culpazinha. A nossa vidinha. É a vida. "Tem de ser". "Eles é que sabem". "Temos de penar as penas que Deus Nosso Senhor nos reservou". "Temos de aguentar". "Temos de nos sacrificar". "Isto custa mas paciência o que é que se vai fazer?!"

Gajos como eu é que ficam perplexos e mal vistos. Não se sentem culpados de nada. Eu por mim não vejo inconveniente em que prendam e mandem a chave fora os facínoras que nos (se) governaram durante os últimos oito séculos. A começar, preferencialmente, pelos ainda vivos, mesmo que habitualmente se encontrem em posições de julgar os outros.