Um dia, quem sabe no tempo dos meus netos, talvez se venha a conhecer entre nós uma Economia aberta e, na qual, o mercado poderá, finalmente, funcionar.
Para já, as expectativas são poucas ou nenhumas de que tal venha a ser verdade. Mas, se formos optimistas, podemos sempre acreditar em fadas dos dentes. Esta curiosa, e imemorial, aliança entre plutocracia e oligarquia parece ser o beco em que as democracias desembocaram e todos parecem satisfeitos. Tanto melhor.
O recente episódio da Media Capital é apenas borbulhagem e espuma de Verão. De facto. Se alguém estivesse efectivamente interessado num mercado livre e aberto já se teria manifestado contra as acções douradas que há por aí. E, elas existem em papel ou em espírito. Mais, nunca se observou alguém, no "arco da governação", ser frontal e abertamente contra essas ‘golden shares'. Ou de outras cores, que não há míngua de ‘shares' laranjas ou rosadas. Com ou sem verdade e políticas de verdade. Ninguém vai dizer nos olhos dos portugueses que vai acabar com essas manobras. Porque só se acabam com transparência. Mas até Setembro aposto dobrado contra singelo que ninguém em boa verdade virá aí dizer que acaba com a coisa. E promove a ética. Temos portanto reunidas as condições para que tudo continue igual. E, de cada vez que cair na rua um episódio, muita gente fingirá surpresa espanto e escândalo. E virá bater no peito. Mas o mercado livre e aberto e respirável não virá. Pântano?
Entre nós as boas ideias nunca são filhas de pai incógnito. Nem de mãe. Mas quando dão raia são inevitabilidades da herança. Como argumento é monótono e aliena eleitores. Depois aborrecem-se com os abstencionistas.
Da mesma sorte de assuntos, constitui a preocupação com o endividamento. Todos os governos utilizaram profusamente a técnica de desorçamentação, e, todos têm mandado (com ou sem dourados retóricos) as empresas alegadamente "privadas" e cotadas em Nova Iorque, endividarem-se e produzirem dívida garantida pelo Estado mas que, convenientemente, não está presente nas operações de cosmética estatística e contabilística com que nos atiram rácios de qualquer coisa sobre o PIB. Nesta área da mascarada temos já doutorados e pós doutorados em fila de espera. É uma vocação magnífica que temos tido desde há muito. A construção de fachadas e a mentira. Agora parece que há outra. Mais uma menos uma. Já se perdeu a aritmética da coisa. Aliás a mentira já nem é novidade que escandalize. É apenas uma constante da equação. Se calhar os exames de matemática ficam fáceis por causa disso mesmo. Existem já tantas constantes que já nem se vislumbram as variáveis.
E, fica sempre bem apresentar um ar de sentido de Estado e falar do futuro dos "nossos" filhos. Que, coitados, vão arcar com a dívida e com os "benefícios". Com a dívida seguramente que os benditos benefícios de estádios do Euro, dos submarinos, da décima quinta travessia Lisboa - Porto em auto-estrada, do TGV entre Faro e Huelva (lembram-se?), dos F16 encaixotados (ou já saíram dos caixotes?), são difíceis de lucubrar.
Ouvi dizer que querem libertar a sociedade do Estado. Cuidado, não vá a "sociedade" não querer a liberdade. Se quisesse já se teria manifestado. Talvez não com a veemência das ruas de Teerão onde há de facto gente que quer ser livre. Mas com um assomo de dignidade. Já se teria dado a exprimir. Contra as ‘golden shares'. Por exemplo. De há muito que a "sociedade" se acostumou a este estado de coisas.
Aceitamos já tudo. Segundo alguns chegámos já ao fundo. Gestos no parlamento. Elegância sublime do presidente da assembleia geral do meu clube, partilhando connosco o estado dos intestinos dele. Enfim. Mas não chegámos ao fundo. Há sempre a possibilidade de descer uma restroescavadora e continuar a aprofundar o buraco. Quiçá um dia atingimos petróleo. Mas não há crise. Em Setembro poderemos mudar. Pelo menos de mentirosos.
publicado no Diário Económico
terça-feira, julho 07, 2009
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